Tem um provérbio africano que diz que quando morre um avô, toda uma biblioteca se vai. Por isso entre os povos africanos e também entre os povos indígenas, a presença do ancião nos círculos comunitários se faz tão necessário, pois ali a memória que cada um porta é convidada a manter-se ativa e presente para as gerações futuras.
Cada imagem de uma história registrada na memória guarda um pedaço de quem somos, do que vivemos e, curiosamente, do que sonhamos ser. Ela é muito mais do que uma simples ferramenta do cérebro – é o que dá sentido à nossa existência. Por isso, cuidar da memória é também cuidar do que nos torna humanos
A ciência já nos deu pistas de como preservar o precioso livro da memória como benefício principalmente para o próprio indivíduo. Falam sobre uma boa alimentação – quem diria que um prato de salmão ou um punhado de nozes poderiam ser aliados da nossa mente? –, sobre a importância do sono e sobre o valor de aprender algo novo, como tocar um instrumento ou explorar outra língua. No fundo, são maneiras de dar ao cérebro novos caminhos, como quem planta árvores em um jardim, garantindo sombra e beleza no futuro.
Quantas vezes nos sentamos à mesa com os mais velhos e ouvimos histórias que parecem sair de um filme antigo? São relatos que, mesmo simples, têm um poder quase mágico: eles nos ligam ao passado e nos fazem sentir parte de algo maior. Sim, pois a memória não vive apenas de biologia. Ela é, também, feita de cultura, de histórias que passam de uma geração a outra
Certa vez, minha avó me contou sobre como, durante a infância dela, os dias terminavam comendo bolo de fubá e tomando café preto e quando ela se tornou anciã, via os netos repetirem felizes os seus mesmos gestos. Ela dizia isso com um sorriso que misturava nostalgia e contentamento. Naquele momento, percebi que a memória não era só dela – era minha também. Essas histórias não apenas nos mantêm conectados; elas dão raízes às nossas próprias identidades.
Hoje, na correria da vida, fica fácil esquecer de cultivar essas lembranças. Vivemos tão conectados às telas que esquecemos o poder do olho no olho, do abraço, do compartilhar histórias. Quem nunca se sentiu isolado, mesmo estando rodeado por pessoas? Esse isolamento, aliás, é um terreno fértil para o esquecimento. A memória, afinal, floresce na troca – seja em uma conversa calorosa, em uma dança compartilhada ou em uma refeição que resgata sabores da infância.
O cuidado com a memória, portanto, não é apenas físico, mas também emocional e cultural. É um convite para nutrir não apenas o corpo e o cérebro, mas as conexões que nos tornam humanos. Quando cuidamos da nossa saúde mental, do nosso sono, do nosso aprendizado, estamos, na verdade, cuidando do fio invisível que nos liga ao mundo e às pessoas que amamos.
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